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Aumento de capital com lucros tributa IR? Análise da lei 15.270/25

A capitalização de lucros no aumento de capital ganhou novo peso com a lei 15.270. Ela continua isenta? Entenda quando a operação segue sem IR e quando gera efeitos fiscais para altas rendas

Com a sanção da lei 15.270/25, proveniente do PL 1087/25, profissionais de contabilidade e do direito foram impulsionados a revisar estruturas empresariais em busca de segurança jurídica e reduzir potenciais impactos da tributação sobre dividendos.

A possibilidade de tributação de lucros e dividendos gerou uma verdadeira corrida pela distribuição até 31/12/2025.

No entanto, um ponto pouco discutido, mas absolutamente relevante, diz respeito ao aumento de capital social com lucros já apurados, operação frequente em empresas de todos os portes. Surge, então, a pergunta central:

O aumento de capital social com capitalização de lucros pode ser tributada?

1 - O que é, exatamente, “aumentar capital com lucros”

A legislação societária denomina essa operação como aumento de capital mediante capitalização (ou incorporação) de lucros, disciplinada no art. 169 da lei 6.404/1976. Apesar de ser um dispositivo das sociedades anônimas, aplica-se por analogia às sociedades limitadas.

E aqui está o ponto mais importante - que precisa ser compreendido antes de qualquer análise tributária:

Trata-se de lucros já apurados em exercícios anteriores, que foram destinados para “lucros acumulados” ou para “reservas de lucros”, ou seja, mantidos no patrimônio líquido da empresa.

Não se trata de distribuição de lucros, mas da destinação de resultados já apurados em exercícios anteriores, registrados como lucros acumulados ou reservas de lucros.

Ou seja:

  • a empresa não está distribuindo e pagando dividendos;
  • o sócio não está recebendo dinheiro;
  • não há crédito individualizado ao sócio no passivo exigível;
  • o lucro permanece dentro da sociedade, sendo apenas reempregado no capital.

Trata-se de uma operação interna ao patrimônio líquido, voltada à reorganização contábil e societária. O aumento de capital mediante a incorporação de lucros ou reservas pode ocorrer pela emissão de novas quotas ou ações, que são distribuídas diretamente pela sociedade aos sócios, não havendo subscrição. Alternativamente, essa operação pode ser realizada por meio da alteração do valor nominal das quotas ou ações já existentes, quando estas possuírem valor definido. Quando as ações não tiverem valor nominal, o aumento de capital pode ocorrer sem a distribuição de novas ações, refletindo apenas a reclassificação contábil no patrimônio líquido.

2 - Reflexos financeiros e a natureza do rendimento

Ao capitalizar lucros, o sócio passa a deter:

  • um aumento proporcional de sua participação societária;
  • um incremento no custo de aquisição das quotas ou ações;
  • porém, não recebe valores em espécie.

A Receita Federal reconhece esse incremento como rendimento, todavia isento ou não sujeito ao imposto de renda (a depender da interpretação), conforme art. 8º, III, da IN RFB 1.500/14:

Art. 8º São isentos ou não se sujeitam ao imposto sobre a renda, os seguintes rendimentos de participações societárias:

III - valores decorrentes de aumento de capital mediante a incorporação de reservas ou lucros apurados a partir de 1º de janeiro de 1996, por pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado;

Ou seja, a capitalização de lucros não é tributável pelo IR na sistemática tradicional.

3 - O novo regime da lei 15.270/25 e o impacto no aumento de capital

A lei 15.270/25 criou um mecanismo inédito: a apuração anual da soma de todos os rendimentos do contribuinte pessoa física (tributáveis e inclusive os isentos) para verificar se ultrapassou o teto de R$ 600 mil, o chamado conceito de “altas rendas”.

Nesse contexto, a operação de aumento de capital assume relevância tributária, por constituir rendimento, que passará a integrar o cálculo da renda total do contribuinte a partir de 2026.

Assim:

  • o rendimento continua isento ou não sujeito ao imposto de renda;
  • mas pode desencadear obrigações de retenção mensal e complementação anual;
  • tornando a operação potencialmente onerosa, dependendo do conjunto dos rendimentos auferidos pelo sócio pessoa física.

4 - A anterioridade protege aumentos realizados em 2025

Não há tributação dos aumentos de capital executados ainda em 2025, por força da anterioridade anual (CF, art. 150, III, “b”). A tributação, quando houver, somente pode ter início em 2026.

Assim, aumentos de capital com lucros realizados neste ano permanecem sob a lógica antiga: isentos e fora do cálculo das altas rendas.

5 - A chave está no art. 16-A, §1º, XII: distribuição até 2025 e “emprego” dos dividendos

Para lucros apurados até 2025, o legislador criou um regime de neutralidade tributária. O art. 16-A, §1º, XII, prevê que não entrarão no cálculo das altas rendas os lucros:

a) apurados até 2025;

b) cuja distribuição tenha sido aprovada até 31/12/2025 pelo órgão societário competente;

c) desde que ocorra o pagamento, crédito, emprego ou entrega entre 2026 e 2028.

E aqui está a interpretação crucial:

A lei permite o “emprego” dos dividendos - e emprego inclui a utilização desses dividendos para aumento de capital.

Isso significa que, se:

  1. os lucros forem distribuídos até 31/12/2025;
  2. e, posteriormente, entre 2026 e 2028, o sócio utilizar esses dividendos para integralizar aumento de capital, não haverá tributação nem retenção, independentemente do valor.

A conjunção “ou”, presente na alínea “c”, reforça a natureza alternativa: o sócio cumpre a lei pagando, creditando, entregando ou empregando.

É possível, ainda, apontar uma interpretação relevante: o pagamento dos dividendos pela sociedade mediante emissão de novas quotas pode ser compreendido nos mesmos termos do que ocorre no mútuo conversível.

No mútuo conversível:

  • o investidor empresta recursos e torna-se credor da empresa;
  • no evento de conversão, esse crédito é “pago” pela sociedade mediante emissão de quotas;
  • há, portanto, quitação sem desembolso de caixa, substituindo-se o crédito por participação societária.

De forma semelhante, quando a sociedade distribuiu dividendos até 2025 e, entre 2026 e 2028, o sócio decide empregar esse crédito (dos dividendos) para integralizar um aumento de capital, a sociedade:

  • paga o dividendo não em dinheiro, mas por meio de quotas recém-emitidas;
  • cumpre a alínea “c” (“pagamento, crédito, emprego ou entrega”);
  • e preserva integralmente a neutralidade fiscal prevista na lei.

Essa interpretação se mostra coerente, técnica e extremamente útil para sociedades que não possuem caixa imediato para pagar os dividendos até 2028, permitindo o cumprimento integral do regime de transição.

6 - A natureza jurídico-tributária dos rendimentos decorrentes da participação societária: isenção ou não incidência?

A correta qualificação jurídica dos rendimentos provenientes de participação societária, especialmente aqueles oriundos de lucros acumulados e reservas de lucros empregados em aumentos de capital, é fundamental para compreender seus efeitos na apuração do imposto de renda da pessoa física e, de forma mais sensível, na aferição da renda global prevista no art. 16-A da lei 15.270/25.

O ponto de partida é o próprio art. 8º da IN RFB 1.500/14, que distingue hipóteses de rendimento tributável, porém isento, daquelas que configuram rendimento não sujeito à incidência, aproximando-se, portanto, da não incidência qualificada. Os incisos I e II tratam de situações cuja tributação é afastada por meio de isenção legal, logo, permanecem juridicamente enquadradas como rendimentos tributáveis. Já os incisos III e IV podem ser compreendidos como hipóteses de não incidência: operações em que, pela própria natureza jurídica, o fato existe, mas não gera obrigação tributária.

Essa distinção não é meramente teórica. Conforme leciona Kiyoshi Harada1, “a não incidência expressa em lei implica necessariamente modificação parcial da norma definidora do fato gerador da obrigação tributária. Representa aquilo que em Direito Penal se denomina de fenômeno da descriminalização. A descriminalização ocorre porque determinada conduta está definida como crime. Igualmente a não incidência tributária juridicamente qualificada ocorre para evitar a incidência da norma jurídica de tributação”. A isenção, ao contrário, pressupõe fato gerador ocorrido e obrigação tributária existente, dispensando-se o pagamento em razão de norma específica, entendimento, aliás, consolidado pelo STF.

Esse debate assume especial relevância quando confrontado com o art. 16-A e §1º da lei 15.270/25, que define o somatório dos rendimentos para fins de aferição de altas rendas, acima de R$ 600 mil anuais. O dispositivo utiliza um rol exemplificativo de rendimentos tributáveis, ainda que isentos, a serem incluídos na soma total. Justamente por essa razão, se determinado acréscimo patrimonial é qualificado como não sujeito ao imposto de renda, não há fundamento jurídico para integrá-lo ao cálculo global, pois, embora o dispositivo apresente um rol exemplificativo, a interpretação sistemática conduz à conclusão de que devem ser considerados apenas os rendimentos efetivamente passíveis de tributação, ainda que alguma lei lhes confira isenção.

Incluir no cálculo global tal rendimento não sujeito ao imposto de renda implicaria tratá-lo como tributável por via reflexa, gerando novo fato gerador por presunção, hipótese incompatível com o art. 146, III, “a”, da Constituição, que exige lei complementar para definir normas gerais em matéria tributária.

Por outro lado, o art. 10 da lei 9.249/1995, ao dispor sobre a “isenção” do imposto de renda incidente sobre dividendos, embora empregue a expressão “não ficarão sujeitos à incidência”, tem sido tradicionalmente interpretado como hipótese de isenção, e não de não incidência. A mesma interpretação poderia se ter do §1º do mesmo artigo, que disciplina o custo de aquisição das quotas ou ações oriundas da capitalização de lucros. Esse contexto evidencia que a análise hermenêutica deve ser conduzida à luz da lógica sistemática do ordenamento, e não apenas da literalidade do texto legal.

Em síntese, permanece aberta a discussão sobre se tais acréscimos patrimoniais devem ser tratados como rendimentos tributáveis isentos ou como rendimentos não sujeitos à incidência, bem como se os não tributáveis devem ser considerados no cálculo global. A distinção, contudo, produz efeitos concretos relevantes, especialmente no cálculo do imposto mínimo e na verificação do limite anual de R$ 600 mil. Trata-se, portanto, de tema que exige interpretação sistemática, profundo domínio das categorias tributárias e atenção redobrada dos profissionais que lidam com planejamento e tributação da renda.

7 - Conclusão: o aumento de capital com lucros tributa?

A resposta depende da interpretação quanto à qualificação do rendimento como isento ou não sujeito ao imposto de renda e, sobretudo, da análise sobre se, mesmo não estando sujeito à tributação, esse rendimento deve ser somado ao conjunto dos demais para a aferição do valor final. Admitindo-se que seja necessária a inclusão de todos os rendimentos recebidos, independentemente da sua natureza tributável ou não, torna-se indispensável avaliar também o ano da operação e do cumprimento das formalidades:

Em 2025:

  • não tributa;
  • não entra no limite das altas rendas;
  • segue como rendimento isento ou não sujeito ao imposto de renda, sem efeitos adversos.

A partir de 2026:

  • entra no cálculo dos rendimentos totais para verificar se supera R$ 600 mil;
  • pode exigir retenção de 10% (se superior a R$ 50 mil);
  • pode gerar tributação complementar na declaração anual do ano seguinte (2027).

Se os lucros forem distribuídos até 31/12/2025 e depois os dividendos empregados no aumento de capital (até 2028):

  • permanecem totalmente isentos;
  • não geram retenção;
  • não integram o cálculo das altas rendas.

Existem outras estratégias societárias e tributárias possíveis, e o acompanhamento técnico qualificado de profissionais da área será decisivo para que empresas e sócios evitem a nova tributação de forma lícita e eficiente.

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